No dia
15 de março, teve muita gente nas ruas e, pelo país afora, centenas de
milhares falaram, se expressaram. Em São Paulo, a Polícia Militar de Geraldo
Alckmin estimou em um milhão de pessoas, enquanto o Data Folha estimou em 210
mil, um número mais razoável e dentro das previsões. Nas demais capitais
o número ficou muito aquém do que se esperava – mas sim, com muita gente nas
ruas.
Quinze de março, para
quem não era nascido ou quem não lembra mais, era a data em que os presidentes
tomavam posse durante o período da ditadura militar. E pelo que se viu, há muita
gente saudosa dessa época. Em Brasília e nas capitais dos estados, não foram
poucos os cartazes e faixas reivindicando intervenção militar – chegaram até a
pedir a intervenção pelos Estados Unidos, vejam só!
Para
Luciana Genro, candidata a presidenta pelo PSOL, “O que salta aos olhos é que a
situação exige uma mudança profunda. Mas nem tudo o que as ruas falam sugerem
um bom caminho. As faixas em favor do golpe são um sintoma claro de que mesmo
que milhares tenham tomado as ruas, não se abriu um caminho novo e
progressista. Não tenho dúvida de que a maioria dos que estavam nos atos não
querem uma saída fascista e nem querem ser controlados por aparatos
burocráticos. Por isso Bolsonaro e Paulinho da Força Sindical foram
hostilizados. As pessoas querem mudanças, mas para que a direita não ganhe na
inércia é preciso avançar em um programa”. E continuou dando o tom: “O que
vimos pelo Brasil foram atos contra o governo Dilma e contra o PT que
expressaram uma indignação geral contra a corrupção e a carestia. Entretanto,
ao não ter uma ideologia crítica, anticapitalista, o que predominou foi a
ideologia da classe dominante, e no guarda chuva desta ideologia as posições de
direita e extrema direita também se expressam”.
Já a grande mídia golpista cumpriu muito bem
o seu papel, dedicando um tratamento todo especial aos protestos. Desde o
início da manhã do dia 15, os principais veículos de comunicação do país
passaram a transmitir ao vivo os protestos em diversas cidades, com
apresentadores inclusive convidando a população a se somar aos mesmos. A
Globonews, TV por assinatura da Rede Globo, foi uma das principais
protagonistas desse tipo de comportamento, exibindo a todo tempo manifestantes
pedindo a intervenção dos militares, a volta da ditadura e a derrubada de
Dilma. E foi uma festa de cartazes e faixas – em inglês, inclusive, onde se
pedia de tudo, até mesmo a morte da presidenta, de petista, de comunista e da
esquerda em geral. Uma dessas faixas, exibida ao
vivo pela mesma Globonews, trazia uma suástica no canto superior esquerdo e os
dizeres: “FFAA, libertem o Brasil ou o mundo sangrará”. Apesar dessas
manifestações de ódio e pedidos reiterados de interrupção da democracia, os
jornalistas que comentavam essas imagens insistiam em dizer que as
manifestações eram “pacíficas” e, pasmem!, “democráticas”.
O deputado federal Renato Simões, do PT do
Distrito Federal afirmou, em um texto publicado em sua página no Facebook, que,
“quando se abre a caixa de Pandora da direita em manifestações de ódio como as
de hoje, o resultado para a democracia é imprevisível”. “No território das ruas
sempre ocupado desde então pela resistência democrática das esquerdas, trava-se
hoje uma batalha presencial e pela cobertura facciosa da mídia privada cuja
versão marcará a disputa política nos próximos meses de forte instabilidade
política”, acrescentou.
Demonstrações
explícitas de fascismo foram abertamente dadas não só por manifestantes
isolados mas pela fala de “lideranças” dos atos desde dia 15, advertiu Renato
Simões. “Aqui em Brasília o Fora Dilma se estendeu ao Congresso, aos políticos
em geral, ao Supremo e à própria democracia. O atentado do fim da manhã à sede
do PT Jundiaí e a estridente parcialidade da cobertura do ato da Paulista pela
rede Globo, que superfatura abertamente a já forte presença na manifestação
mostra que está plantado em São Paulo o epicentro do golpismo, e em comum apontam
para a necessidade de forte unidade em defesa da democracia e das reformas
estruturais da política e da mídia tão necessárias e urgentes”, completou o
deputado.
Para
o cientista político Antonio Lassance, “as manifestações do dia 15 são uma marcha
golpista, antidemocrática, hipócrita, financiada empresarialmente, comandada
pelos partidos que perderam as eleições e coalhada de gente irritada que quer
apenas desabafar, mas não faz a menor ideia dos interesses que estão por trás
do convite que receberam para protestar”. “Falar de impeachment não é golpismo,
certo? Certíssimo. Mas falar de impeachment de uma presidente da República
eleita sobre a qual não pesa, em qualquer inquérito, a mínima evidência de
qualquer envolvimento com crimes de corrupção é golpismo sim, senhor. Golpismo
da pior espécie”, completou Lassance.
É preciso que se lembre a todos aqueles que
não eram nascidos na década de 1960 e para aqueles que já esqueceram o que
aconteceu durante a ditadura, que as passeatas do 15 de março são tão
inofensivas para as instituições quanto foram aquelas que serviram de mote para
o golpe de 1964. Passeatas feitas por gente que quer o impeachment de
Dilma, mas gastou seu tempo no Congresso, nesta última semana, defendendo
Eduardo Cunha e Renan Calheiros contra a ação do Procurador-Geral da República
no escândalo da Lava Jato.
Ontem, deu para perceber o tamanho do golpismo
no Brasil. Vimos a sua face mais nefasta; os ovos da serpente foram chocados e
as víboras já estão nas ruas. Ontem, a Caixa de Pandora foi aberta e ninguém
sabe ainda o que sairá de seu interior, apenas que boa coisa não pode ser.
Mas Antonio Lassance, em seu artigo, deixa uma
frase otimista, que servirá para a reflexão de cada brasileiro consciente do
seu papel de protagonista da história e defensor da democracia: “o Dia 15
passará para a posteridade como o dia em que a oposição, cansada de perder
eleições, teve uma vitória de Pirro, mas saiu derrotada ao assumir de vez seu
espírito antidemocrático, golpista, hipócrita e irresponsável diante das
instituições do país”. Lassance, eu acrescento à sua fala, o seguinte: tudo vai
depender do que o Palácio do Planalto e a base de sustentação do governo
farão a partir de hoje – porque nós, que defendemos o Brasil, já estamos na
luta há tempos!
* Fabiana Agra é advogada e
jornalista
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