segunda-feira, 16 de março de 2015


No dia 15 de março, teve muita gente nas ruas e, pelo país afora, centenas de milhares falaram, se expressaram. Em São Paulo, a Polícia Militar de Geraldo Alckmin estimou em um milhão de pessoas, enquanto o Data Folha estimou em 210 mil, um número mais razoável e dentro das previsões. Nas demais capitais o número ficou muito aquém do que se esperava – mas sim, com muita gente nas ruas.
Quinze de março, para quem não era nascido ou quem não lembra mais, era a data em que os presidentes tomavam posse durante o período da ditadura militar. E pelo que se viu, há muita gente saudosa dessa época. Em Brasília e nas capitais dos estados, não foram poucos os cartazes e faixas reivindicando intervenção militar – chegaram até a pedir a intervenção pelos Estados Unidos, vejam só!
Para Luciana Genro, candidata a presidenta pelo PSOL, “O que salta aos olhos é que a situação exige uma mudança profunda. Mas nem tudo o que as ruas falam sugerem um bom caminho. As faixas em favor do golpe são um sintoma claro de que mesmo que milhares tenham tomado as ruas, não se abriu um caminho novo e progressista. Não tenho dúvida de que a maioria dos que estavam nos atos não querem uma saída fascista e nem querem ser controlados por aparatos burocráticos. Por isso Bolsonaro e Paulinho da Força Sindical foram hostilizados. As pessoas querem mudanças, mas para que a direita não ganhe na inércia é preciso avançar em um programa”. E continuou dando o tom: “O que vimos pelo Brasil foram atos contra o governo Dilma e contra o PT que expressaram uma indignação geral contra a corrupção e a carestia. Entretanto, ao não ter uma ideologia crítica, anticapitalista, o que predominou foi a ideologia da classe dominante, e no guarda chuva desta ideologia as posições de direita e extrema direita também se expressam”.
Já a grande mídia golpista cumpriu muito bem o seu papel, dedicando um tratamento todo especial aos protestos. Desde o início da manhã do dia 15, os principais veículos de comunicação do país passaram a transmitir ao vivo os protestos em diversas cidades, com apresentadores inclusive convidando a população a se somar aos mesmos. A Globonews, TV por assinatura da Rede Globo, foi uma das principais protagonistas desse tipo de comportamento, exibindo a todo tempo manifestantes pedindo a intervenção dos militares, a volta da ditadura e a derrubada de Dilma. E foi uma festa de cartazes e faixas – em inglês, inclusive, onde se pedia de tudo, até mesmo a morte da presidenta, de petista, de comunista e da esquerda em geral. Uma dessas faixas, exibida ao vivo pela mesma Globonews, trazia uma suástica no canto superior esquerdo e os dizeres: “FFAA, libertem o Brasil ou o mundo sangrará”. Apesar dessas manifestações de ódio e pedidos reiterados de interrupção da democracia, os jornalistas que comentavam essas imagens insistiam em dizer que as manifestações eram “pacíficas” e, pasmem!, “democráticas”.
O deputado federal Renato Simões, do PT do Distrito Federal afirmou, em um texto publicado em sua página no Facebook, que, “quando se abre a caixa de Pandora da direita em manifestações de ódio como as de hoje, o resultado para a democracia é imprevisível”. “No território das ruas sempre ocupado desde então pela resistência democrática das esquerdas, trava-se hoje uma batalha presencial e pela cobertura facciosa da mídia privada cuja versão marcará a disputa política nos próximos meses de forte instabilidade política”, acrescentou.
Demonstrações explícitas de fascismo foram abertamente dadas não só por manifestantes isolados mas pela fala de “lideranças” dos atos desde dia 15, advertiu Renato Simões. “Aqui em Brasília o Fora Dilma se estendeu ao Congresso, aos políticos em geral, ao Supremo e à própria democracia. O atentado do fim da manhã à sede do PT Jundiaí e a estridente parcialidade da cobertura do ato da Paulista pela rede Globo, que superfatura abertamente a já forte presença na manifestação mostra que está plantado em São Paulo o epicentro do golpismo, e em comum apontam para a necessidade de forte unidade em defesa da democracia e das reformas estruturais da política e da mídia tão necessárias e urgentes”, completou o deputado.
Para o cientista político Antonio Lassance, “as manifestações do dia 15 são uma marcha golpista, antidemocrática, hipócrita, financiada empresarialmente, comandada pelos partidos que perderam as eleições e coalhada de gente irritada que quer apenas desabafar, mas não faz a menor ideia dos interesses que estão por trás do convite que receberam para protestar”. “Falar de impeachment não é golpismo, certo? Certíssimo. Mas falar de impeachment de uma presidente da República eleita sobre a qual não pesa, em qualquer inquérito, a mínima evidência de qualquer envolvimento com crimes de corrupção é golpismo sim, senhor. Golpismo da pior espécie”, completou Lassance.
É preciso que se lembre a todos aqueles que não eram nascidos na década de 1960 e para aqueles que já esqueceram o que aconteceu durante a ditadura, que as passeatas do 15 de março são tão inofensivas para as instituições quanto foram aquelas que serviram de mote para o golpe de 1964. Passeatas feitas por gente que quer o impeachment de Dilma, mas gastou seu tempo no Congresso, nesta última semana, defendendo Eduardo Cunha e Renan Calheiros contra a ação do Procurador-Geral da República no escândalo da Lava Jato.
Ontem, deu para perceber o tamanho do golpismo no Brasil. Vimos a sua face mais nefasta; os ovos da serpente foram chocados e as víboras já estão nas ruas. Ontem, a Caixa de Pandora foi aberta e ninguém sabe ainda o que sairá de seu interior, apenas que boa coisa não pode ser.
Mas Antonio Lassance, em seu artigo, deixa uma frase otimista, que servirá para a reflexão de cada brasileiro consciente do seu papel de protagonista da história e defensor da democracia: “o Dia 15 passará para a posteridade como o dia em que a oposição, cansada de perder eleições, teve uma vitória de Pirro, mas saiu derrotada ao assumir de vez seu espírito antidemocrático, golpista, hipócrita e irresponsável diante das instituições do país”. Lassance, eu acrescento à sua fala, o seguinte: tudo vai depender do que o Palácio do Planalto e a base de sustentação do governo farão a partir de hoje – porque nós, que defendemos o Brasil, já estamos na luta há tempos!

* Fabiana Agra é advogada e jornalista



Nenhum comentário:

Postar um comentário