O aplicativo WhatsApp é uma
ferramenta bastante eficaz quando dirigida para o compartilhamento de conteúdos
voltados ao estudo, à pesquisa ou mesmo à conversação; mas não é para estudos
ou conversação que ele está sendo usada, ao menos em Picuí. O WhatsApp está
sendo utilizado pelos nossos adolescentes para o compartilhamento de conteúdo
pornográfico, já que fotografias de
adolescentes da nossa comunidade estão sendo compartilhadas por usuários desse
aplicativo. Eu soube do que estava acontecendo esta semana, e consegui ver as
imagens picantes – confesso que fiquei revoltada e acuada, pois quando
assistimos na TV, o problema parece distante de nós, mas quando reconhecemos a
criança que está naquelas imagens, aí “a ficha cai” e percebemos que chegou a
hora de fazer algo para coibir tal prática.
Após ver algumas imagens de uma
menina que mal saiu da puberdade e uma foto de um rapaz que, acredito, ainda
ser menor de idade, completamente nus, entreguei o celular ao adolescente e
tentei explicar para ele o absurdo e o perigo que é aceitar e compartilhar tal
conteúdo. No entanto, para minha surpresa, o rapaz deu um sorriso e disse: “-
Doutora, isso agora virou moda e chegou em Picuí”. Essa frase me pegou de
surpresa e fiquei totalmente sem resposta na hora. Mas, após uma rápida
pesquisa na Internet, descobri que a tal "moda" começou nos Estados
Unidos (claro) e é chamada de sexting.
Segundo Kleber Tomaz, do site G1, o termo é originado da união de duas palavras em
inglês: “sex” (sexo) e “texting” (envio de mensagens). Para praticar o
“sexting”, meninos e meninas produzem e enviam fotos sensuais de seus corpos
nus ou seminus usando celulares, câmeras fotográficas, contas de e-mail, salas
de bate-papo, comunicadores instantâneos e sites de relacionamentos.
A prática consiste e existe para que os
adolescentes, ávidos por atenção e afirmação nessa fase de vida onde os
hormônios fazem a festa, possam se exibir em imagens postadas por eles mesmos –
no caso picuiense, através do aplicativo WhatsApp. E vale tudo para chamar a
atenção: as meninas ficam só de lingerie ou biquíni, fazendo poses “sensuais”,
enquanto os garotos preferem ficar de cuecas, sem camisa, ou abraçar garotas
simulando atos sexuais. As fotos que vi são ainda mais chocantes, pois as
imagens mostram adolescentes completamente despidos e mostrando em detalhes
suas partes íntimas.
O artigo 241 do Estatuto da Criança e
do Adolescente (ECA) define o que é pornografia infantil: “Para efeito dos crimes previstos nesta lei, a expressão ‘cena de sexo
explícito ou pornográfica’ compreende qualquer situação que envolva criança ou
adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição
dos órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente
sexuais”.
No entanto, é preciso cautela da nossa
parte para que não haja exageros e injustiças, pois a postagem de fotos sensuais de adolescentes tem de
ser analisada caso a caso, às vezes o
adolescente trabalha como modelo e tem a autorização dos pais para publicar
essas imagens na internet. Ou às vezes não. Pode ser que alguém tenha
conseguido essas fotos provocantes e divulgado sem a autorização do(a) jovem.
Pode ser que o(a) adolescente tenha mandado a foto para o(a) namorado(a) ou
paquera e ele(a) a distribuiu sem o consentimento da mesmo. No entanto, ao
menos aos fotos que eu vi não são sensuais – é material pornográfico, e quem
aceitar ou compartilhar tais conteúdos poderá ser enquadrado no crime de
pornografia infantil.
Internet, celular, máquina digital.
Estas tecnologias potencializaram algo típico da adolescência – o exibicionismo
em busca da aceitação na tribo. É por isso que se faz necessário discutir
sexualidade na família e na escola para que ele não vire sexo precoce ou até
mesmo termine em suicídio. Moisés de Oliveira
Cassanti, autor do livro “Crimes virtuais, vítimas reais”, demonstra que a prática
do sexting
envolve vários riscos de integridade psicológica, jurídica e
mesmo física dos participantes, tais como:
1-
Risco de exposição a pedófilos e outros predadores ou chantagistas.
2 - A responsabilidade penal: a imagem da pessoa é protegida
pela Constituição. Além disso, certas imagens produzidas ou transmitidas por
menores de idade poderá ser considerado pornografia infantil.
3 - Riscos psicológicos: uma pessoa cuja imagem ou
vídeo erótico é distribuído sem controle pode ser publicamente humilhado e
molestado (cyberbullying se menor de
idade), e sofre sérios problemas por causa disso, como ansiedade, depressão,
baixa auto-estima, trauma, humilhação, isolamento social, etc. Alguns
especialistas argumentam que o risco social é maior em cidades pequenas. Há
casos de adolescentes que tiveram de abandonar a escola ou ir para outro lugar
por causa da difusão dessas imagens – e há registros até mesmo de casos de
suicídio.
4 - Desde 2009 estão se proliferando websites dedicados a coletar e explorar
comercialmente as fotos e vídeos criados por sexting. Qualquer imagem sexual fora do telefone, da webcam ou do
e-mail, pode acabar em um desses sites e proporcionar benefícios econômicos
para os outros e alimentar as fantasias eróticas de milhares de usuários da
Internet.
Moisés Cassanti ainda faz um alerta aos pais: “não negar o problema e tomar medidas. Seus filhos
também são afetados. Reconheça que a combinação da tecnologia com os hormônios
adolescentes pode ser explosiva. Se os seus filhos vão (ou querem namorar
alguém), aceite que pode haver sexo nessa relação e ter uma câmera no celular é
muito tentador neste contexto. É seu dever como um pai (ou mãe) descobrir sobre
as implicações desta e de agir para proteger seus filhos”.
Enfim, o problema chegou a Picuí e
precisamos enfrenta-lo. Pais, conversem com seus filhos. Educadores, conversem
com seus alunos. Falem sobre sexting. Perguntem sobre de que forma eles
utilizam a Internet e os celulares. É preciso explicar para os adolescentes que as fotos e mensagens enviadas através dos seus celulares não são
realmente anônimas ou privadas e que outros podem transmiti-las sem o seu
consentimento. A minha maior preocupação no momento é o dano que aquelas
imagens que eu vi no WhatsApp podem fazer aos adolescentes que se deixaram
fotografar. A coisa é séria, a coisa está sem controle.
Alertamos aos pais e autoridades
não só de Picuí mas de toda a nossa região: vamos combater esse crime antes que
o pior comece a acontecer, pois o mal já foi instaurado.
* Fabiana Agra é advogada,
jornalista e escritora.
Nenhum comentário:
Postar um comentário