sexta-feira, 24 de abril de 2015

A Câmara dos Deputados terceirizou geral


E não adiantaram os protestos por parte de centrais sindicais e movimentos sociais, Eduardo Cunha “peitou” e a Câmara dos Deputados aprovou, na noite da última quarta-feira, 22 de abril, a emenda que permite a terceirização das atividades-fim das empresas do setor privado, alterando também diversos pontos do texto-base da proposta. A emenda, de autoria do PMDB e do Solidariedade, foi aprovada por 230 votos a 203 – placar bem mais apertado do que o anterior, convenhamos.
O texto da emenda, apesar de não usar os termos “atividade-fim” ou “atividade-meio”, permite a terceirização de qualquer setor de uma empresa. Assinada pelo relator do projeto, deputado Arthur Oliveira Maia (SD-BA), e pelo líder do PMDB, deputado Leonardo Picciani (RJ), a emenda também ampliou os tipos de empresas que podem atuar como terceirizadas, abrindo a oferta às associações, às fundações e às empresas individuais (de uma pessoa só). O produtor rural pessoa física e o profissional liberal poderão figurar como contratante.
Outra mudança em relação ao texto-base, segundo o portal da Câmara dos Deputados, é a diminuição, de 24 para 12 meses, do período de quarentena que ex-empregados da contratante têm de cumprir para poder firmar contrato com ela se forem donos ou sócios de empresa de terceirização. Os aposentados não precisarão cumprir prazo. A quarentena procura evitar a contratação de ex-empregados por meio de empresas individuais. Já a subcontratação por parte da contratada (“quarteirização”) somente poderá ocorrer quando se tratar de serviços técnicos especializados. A emenda também determina que, nos contratos de terceirização não sujeitos à retenção na fonte de 11% da fatura ou às alíquotas relativas à desoneração da folha de pagamentos, a contratante será obrigada a reter o equivalente a 20% da folha de salários da contratada, descontando da fatura. Outra mudança feita pela emenda diminui o recolhimento antecipado do Imposto de Renda na fonte de 1,5% para 1% para empresas de terceirização dos serviços de limpeza, conservação, segurança e vigilância.
Em relação à sindicalização, ficou mantido o trecho do texto-base, que prevê a filiação dos terceirizados ao mesmo sindicato da contratante apenas se ambas as empresas pertencerem à mesma categoria econômica. Entretanto, a emenda retira a necessidade de se observar os respectivos acordos e convenções coletivas de trabalho. Quanto à responsabilidade da contratante, a emenda torna solidária a responsabilidade da contratante em relação às obrigações trabalhistas e previdenciárias devidas pela contratada. Nesse tipo de responsabilidade, o trabalhador pode processar tanto a contratada quanto a contratante.

A bancada da Paraíba dividida
Conforme lista disponível no site da Câmara, a bancada federal paraibana ficou dividida, dessa vez. Na votação anterior, apenas os deputados Luiz Couto e Damião Feliciano votaram contra a proposta. Já na votação do último dia 22, os votos ficaram assim divididos: pelo “Não à terceirização” – Luiz Couto (PT), Damião Feliciano (PDT), Veneziano Vital do Rego (PMDB), Wellington Roberto (PPS), Pedro Cunha Lima (PSDB) e Wilson Filho (PTB). Já os deputados que continuaram votando pelo “Sim à terceirização” foram: Hugo Motta (PMDB), Manoel Junior (PMDB), Rômulo Gouveia (PSD) e Benjamim Maranhão (Solidariedade). Efraim Filho (DEM) e Aguinaldo Ribeiro (PP) não aparecem em nenhum das listagens e, das duas uma: ou estavam ausentes no momento da votação ou abstiveram-se de votar.

Agora é com o Senado...
O texto da do projeto de lei da terceirização (PL 4330/04) seguirá agora para o Senado e o tempo promete virar! É que Renan Calheiros já declarou que no senado a terceirização de Eduardo Cunha e dos deputados não passa: "Regularizar os direitos do trabalhador terceirizado tudo bem, mas retirar os direitos dos trabalhadores, isso não vamos permitir", declarou o presidente do Senado. Eduardo Cunha, por sua vez, ao saber do posicionamento do senador de seu mesmo partido, disse que dará o troco, sabotando projetos de senadores que tramitam na Câmara dos Deputados. "Pau que dá em Chico também dá em Francisco", ameaçou.
A senadora Fátima Bezerra (PT/RN) disse, em Plenário, nessa quinta-feira (23), que a classe trabalhadora do país amanheceu de luto em razão da aprovação da terceirização: “Os deputados que votaram ontem a favor desse projeto, infelizmente deram às costas para a sociedade e ignoraram os veementes protestos das centrais sindicais e movimentos sociais que vem se manifestando rotineiramente contra a aprovação de uma proposta que representa um sério retrocesso nas relações trabalhistas no Brasil”, destacou a parlamentar. Fátima lembrou que a permissão de contratação de terceirizados para atividades-fim, que abre possibilidades como a de uma universidade contratar terceirizados para serem professores, não moderniza e nem avança na proteção dos direitos dos trabalhadores. Pelo contrário, é um atraso para o país.
A senadora pelo PT espera que, no Senado, aconteça um intenso debate sobre o tema antes de uma decisão. Ela lembrou, inclusive, que o presidente da Casa, Renan Calheiros, já garantiu que a matéria não será aprovada na Casa no afogadilho. “Quero dizer aos trabalhadores que a luta não está terminada. Esta matéria ainda virá para esta Casa e espero que o Senado tenha lucidez política, clareza histórica e sensibilidade suficientes para corrigir essa anomalia cometida pela Câmara, que foi a aprovação do PL 4330”, ressaltou Fátima.

...Ou com Dilma
Nessa quinta-feira (23), o deputado Vicentinho (PT-SP) conversou com a Revista Fórum, sobre o Projeto de Lei 4.330/04. Com o PL indo para o Senado, ele espera que os trabalhadores se mobilizem ainda mais para pressionar os parlamentares a votarem em defesa dos cidadãos, e não apenas do empresariado. Vicentinho garante que a presidenta Dilma Rousseff deve dar atenção especial aos pontos que abordam a terceirização em atividade-fim e a responsabilidade solidária do contratante e o fornecedor da mão de obra terceirizada: “A presidenta Dilma não vacilará em vetar principalmente a terceirização na atividade-fim da empresa e a relação sobre a responsabilidade solidária”
Vicentinho ainda comentou sobre a aprovação da emenda: “Realmente, muito lamentável o que aconteceu na Câmara dos Deputados. Mas já era de se esperar, uma vez que temos a clara consciência de que o atual perfil da Câmara é conservador, retrógrado e nitidamente empresarial. Já no Senado, o processo será diferente, pois o presidente Renan Calheiros já anunciou que a matéria será tratada de outra forma, valorizando o debate e a participação social”.

Chegou a hora de ir para a rua
Pelo tom dos congressistas do PT, percebe-se que todos estão esperando a forma através da qual o PL 4.330/04 será tratado no Senado, devido à fala de Renan Calheiros sobre o assunto. Porém, se ainda assim, a terceirização passar da forma que está, também pelo Senado, ainda haverá o veto da presidenta Dilma que, provavelmente, não vetará totalmente o projeto de lei, mas os pontos mais danosos para os trabalhadores.
Agora é chegada a hora de mobilização e cobrança por parte de todos os trabalhadores, é hora de sair às ruas e lutar pelo presente e futuro do emprego no Brasil. É hora de evitar que os avanços dos últimos 70 anos virem pó.
Agora sim, é hora de ir para as ruas!

* Fabiana Agra é advogada e jornalista






domingo, 19 de abril de 2015

Os prós e contras acerca da unificação das eleições


Entre os vários temas em debate acerca da tão falada mas ainda pouco conhecida “Reforma Política”, ganham destaques as discussões sobre o “financiamento das campanhas eleitorais e dos partidos políticos”, que tem por objetivo primordial, independentemente do modelo a ser adotado, a diminuição da influência do poder econômico no resultado das eleições; a questão da “reeleição para os cargos eletivos do Poder Executivo” é outro ponto controvertido; mas atualmente é a “unificação das eleições” – na prática, a implantação da coincidência de mandatos nos níveis nacional, estadual, distrital e municipal – que tem chamado grande atenção da mídia e dos legisladores.
As propostas de emenda à Constituição têm em comum a ideia de que as eleições municipais deveriam ser realizadas no mesmo dia – ou em período bastante próximo – das eleições gerais (estaduais e nacional). Pela relevância do tema, trago os argumentos de quem é a favor e contra a unificação das eleições, para uma posterior análise de cunho mais pessoal.

Eleições unificadas: maior economia e governabilidade
Aqueles que defendem a unificação apontam, basicamente, quatro argumentos que sustentariam os benefícios dessa mudança:
1) redução nos custos das eleições, em seu aspecto operacional, pois a organização do pleito ficaria mais barata aos cofres da Justiça Eleitoral;
2) haveria o barateamento das campanhas eleitorais;
3) os partidos políticos seriam fortalecidos com essa medida, uma vez que as campanhas dentro de cada agremiação teriam que obter uma coordenação mais organizada e centralizada e
4) a realização de eleições unificadas a cada quatro ou cinco anos favoreceria a governabilidade, facilitando, sobremaneira, a execução de políticas públicas, em especial nas áreas em que o Brasil tem maior carência, como saúde, saneamento, segurança pública e educação.
Para os defensores da unificação das eleições, o modelo atual, com eleições intercaladas a cada dois anos, prejudicaria as políticas públicas na esfera municipal, já que justo na metade do mandato dos municipais as eleições estaduais e nacional “paralisariam” a máquina pública.
Elga Figueiredo, advogada e especialista em direito do consumidor, comunga com este pensamento, em artigo publicado na internet. Segundo ela, “estima-se que no Brasil cada pleito eleitoral custa aos cofres públicos para sua viabilização em torno de R$ 265 milhões, um dos fatores que, após muita discussão, ensejara na Proposta de Emenda à Constituição de autoria do senador Romero Jucá (PMDB-PR), prevendo unificação das eleições para todos os cargos em nosso país. Para que isso seja possível, os candidatos eleitos em 2016 ou teriam mandato de apenas dois anos ou o período de atuação no cargo se estenderia até 2018, ocasião em que seria possível coincidir os processos eleitorais.
Segundo Figueiredo, “muito ainda se discute se a medida valeria já para 2018 ou para 2022, porém, essa vertente dentro da discussão da reforma política brasileira tem ganhado a cada dia mais repercussão no cenário nacional. De acordo com o autor da proposta, dizer que a eleição coincidente faria com que o pleito fosse somente nacional não é verdade, porque cada candidato a presidente da República teria que ter, em cada Estado, em cada Município, uma candidatura que o apoiasse apresentando políticas públicas que tivessem enfoque nacional, estadual e municipal. Administrativamente para os gestores de todas as esferas seria muito melhor, pois haveria a possibilidade de exercer mandato com um mesmo gestor durante todo o período, sem ocorrer a incerteza de retaliações quando alguém da base não fosse eleito”, completa a advogada, em sua defesa.

Eleições unificadas: uma afronta à democracia
Em recente reportagem do site Congresso em Foco, Joelson Dias – ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral e Marilda Silveira e Daniel Falcão – professores de Direito Eleitoral, apontam sete razões pelas quais a unificação das eleições, em discussão no Congresso, é prejudicial à administração pública, aos mandatários, aos partidos políticos, aos candidatos e aos eleitores:
I – A unificação das eleições comprometerão o direito de participação política e escolha dos eleitores e enfraquecerão as instituições democráticas: por longo período, entre uma eleição e outra, os eleitores não serão ouvidos e, consequentemente, também serão menos debatidas as questões políticas do País. Os cidadãos ficarão ainda mais afastados da política, pois exercerão seu direito fundamental ao voto somente uma vez a cada quatro ou cinco anos e, como resultado disto, também a classe política e as instituições democráticas diminuídas em sua legitimidade. O jovem, cujo voto é facultativo, que completar 16 (dezesseis) anos somente após as eleições, irá às urnas, pela primeira vez, apenas quatro ou cinco anos depois, aos seus 20 (vinte) ou 21 (vinte e um) anos. Restará prejudicado o elemento pedagógico do voto. Com a unificação das eleições, quem mais perde, portanto, são os próprios eleitores.
II – As eleições unificadas comprometerão a administração do pleito pela Justiça Eleitoral e a sua atuação jurisdicional: a mudança acarretará um inegável assoberbamento da Justiça Eleitoral dificultando, ainda mais, o gerenciamento e a fiscalização do processo eleitoral: em, aproximadamente seis meses, os órgãos da Justiça Eleitoral seriam responsáveis por fiscalizar e julgar milhares de prestações de contas, registros de candidaturas e ações de impugnação, investigações judiciais eleitorais, recursos contra expedição de diplomas e impugnações de mandatos eletivos. Tudo isso, sem computar as incontáveis representações ajuizadas contra as propagandas eleitorais em curso. A proposta prevê, na verdade, a realização de 5.570 eleições municipais (prefeitos e vereadores), 26 eleições estaduais (governador, deputados federais, senadores e deputados estaduais), uma eleição distrital e a eleição nacional (presidente da República) numa mesma data ou, em hipótese alternativa, em datas bem próximas. A administração do pleito pela Justiça Eleitoral e a sua atuação jurisdicional restariam seriamente comprometidas diante do gigantismo que representa a unificação das eleições.
III – As eleições unificadas dificultarão e encarecerão a veiculação da propaganda eleitoral: a veiculação da propaganda eleitoral em geral, especialmente a distribuição do seu tempo no rádio e na televisão, será imensamente dificultada diante do elevado número de candidatos em uma eleição unificada. Não apenas pelo tempo e diversidade dos meios de propaganda eleitoral, mas também pela compreensão dos programas partidários e das propostas dos inúmeros candidatos concorrentes ao pleito, especialmente levando-se em conta que, no federalismo brasileiro, cada ente tem competências privativas e concorrentes.
IV – As eleições unificadas não simplificarão o sistema eleitoral, nem facilitarão a sua compreensão pelo eleitor: é inevitável o prejuízo no que toca a capacidade de reflexão sobre as propostas e nomes a serem escolhidos na urna eletrônica. Trata-se do enorme número de candidaturas além da mistura, em si, de temas locais, estaduais e nacionais para definição de oito candidatos diferentes. Com toda essa complexidade, as eleições unificadas violariam um dos propósitos básicos que deve ter toda e qualquer reforma política: a simplificação do sistema eleitoral visando a sua melhor compreensão pelo eleitor.
V – As eleições unificadas resultarão em menosprezo pela sociedade da importância do sistema político e das práticas democráticas: com a coincidência dos mandatos, os candidatos derrotados terão dificuldade muito maior de enfrentar a maioria estabelecida. Isso porque somente terão uma nova oportunidade de candidatarem-se e/ou tornarem-se conhecidos diante do eleitorado após quatro ou cinco anos. E, em caso de nova derrota eleitoral, após tanto tempo, estarão praticamente alijados da vida política. O preço a ser pago pela possibilidade de todos os mandatos iniciando e terminando juntos pode muito bem ser o da verticalização do voto pelo eleitor, de presidente a vereador de um mesmo partido ou coligação, de aniquilamento das minorias e da oposição locais durante o longo tempo de espera entre uma e outra campanha eleitoral. A realização de eleições somente a cada quatro ou cinco anos dispensará os partidos políticos e governantes da necessidade de se submeterem à avaliação política mais periódica da sua atuação (“accountability”) e suprimirá dos eleitores e da oposição o direito de crítica que os debates eleitorais fomentam a cada dois anos.
É preciso avaliar se, de fato, a unificação não dificultará a “oxigenação” das eleições e incrementará o custo das campanhas eleitorais, pois os candidatos que postulam pela primeira vez a sua eleição ou são pouco conhecidos também terão necessidade de mais recursos para obterem reais chances de vitória no escrutínio unificado. Dessa forma, o papel dos candidatos e partidos de oposição, em quaisquer das esferas federativas, restará ainda mais dificultado, fato este que atinge diversos princípios constitucionais, como, por exemplo, o republicano, que assegura a periodicidade das eleições, o pluripartidarismo e a garantia de preservação das minorias.
VI – As eleições unificadas não condicionam nem o fim da reeleição, nem o aventado aumento para 5 (cinco) anos do período de mandato, nem a necessária garantia da governabilidade: nem o pretendido fim da reeleição, nem o aventado aumento para 5 (cinco) anos do período de mandato, nem mesmo a tão propalada necessidade de se garantir a governabilidade estão necessariamente vinculados à unificação das eleições. No tocante à governabilidade, por exemplo, a própria reforma política que se pretende poderá, em sendo mesmo este o caso, promover os ajustes pontuais necessários na lei de responsabilidade fiscal, por exemplo, ou na própria legislação eleitoral, de modo não somente a permitir, mas, inclusive, fomentar, mesmo no ano das eleições, a execução de políticas públicas, em especial nas áreas em que o Brasil mais precisa, como saúde, saneamento, segurança pública e educação. Hoje, a reclamação é que a legislação eleitoral impõe uma série de restrições a alguns atos de governo, como a execução de convênios em anos eleitorais. Contudo, entendemos, é a coincidência dos mandatos que pode resultar em longo tempo de espera pelos Estados e Municípios para o recebimento de transferências voluntárias ou a celebração de novos convênios, até as eleições seguintes, a depender das composições ou disputas políticas entre as respectivas circunscrições eleitorais ou com a União.
VII – As eleições unificadas ao invés de baratear poderão é encarecer as campanhas eleitorais: a unificação das eleições para a coincidência dos mandatos também repercutirá na oferta dos mais diversos bens e serviços durante as eleições, impactando na forma de realização do trabalho, na qualidade e na engenharia de mercado desses serviços e, igualmente, nos custos das campanhas eleitorais em razão do grande número de candidatos e cargos em disputa, bem assim da dedicação dos melhores profissionais às eleições presidenciais e de governadores. Isto é, mesmo que não venha a ser mais necessário buscar financiamento a cada dois anos, com o fim dos pleitos intercalados, como defendem alguns, o gasto com a campanha eleitoral em eleições unificadas pode ser muito maior, especialmente se consideradas as “dobradas” na propaganda eleitoral, ou seja, o apoio político e financeiro entre os candidatos e também entre os partidos. Ademais, se for necessário aumentar o tempo de veiculação da propaganda eleitoral no rádio e na televisão, em razão do elevado número de candidatos, crescerá, também, na mesma proporção, o montante da compensação fiscal devido às emissoras pela cedência do referido “horário gratuito”, e, portanto, o custo das eleições para os próprios contribuintes. Em poucas palavras, ao invés do seu cogitado barateamento, as campanhas eleitorais poderão é sair mais caras com a unificação das eleições.

No terceiro e último artigo sobre a “unificação das eleições, trarei um desfecho sobre o tema, ocasião em que esmiuçarei o que ainda restou nebuloso sobre o assunto, conferindo também a minha opinião acerca da polêmica. Até breve.

* Fabiana Agra é advogada e jornalista.


quinta-feira, 16 de abril de 2015

Prorrogação do mandato de prefeitos e vereadores e a unificação das datas eleitorais


A unificação das datas eleitorais é um dos temas que prometem movimentar o segundo semestre no Congresso Nacional, com relação à reforma política. A proposta, em um primeiro momento, parece simples: em vez de eleições a cada dois anos, todas as eleições passariam a acontecer na mesma data – ou seja, a cada quatro anos, todos os cidadãos elegeriam prefeitos, governadores, presidente, deputados, senadores e vereadores de uma vez só.
Mas para que isso seja possível, os mandatos de prefeitos e vereadores eleitos em 2016 – para uma minoria de deputados, aqueles eleitos em 2012 – seriam prorrogados por mais dois anos. Isso sem falar das conseqüências que a prática poderia trazer para a democracia... Vamos ao ponto e ao contraponto.

Os “a favor”
Quem defende a ideia, justifica o custo financeiro das eleições e o fim dos "apagões" nos parlamentos em anos eleitorais. Cada eleição no país custa mais de meio bilhão de reais e o Brasil não deveria mais custeá-las a cada dois anos, dizem os defensores da medida. Para a deputada federal Rosane Ferreira (PV), a medida é positiva, ela acredita que isso impedirá as paralisações do Congresso que ocorrem a cada dois anos e deve mudar o comportamento de muitos. "Hoje é um horror. Tem pessoas que se elegem deputados e passam os dois primeiros anos apenas investindo em um município, em função da campanha municipal. Não é para isso que serve um deputado federal", afirma.
Mas para o senador Waldemir Moka, (PMDB-MS) a possibilidade de esticar os atuais mandatos é praticamente nula: “Esqueçam a prorrogação de mandato, não há legitimidade para isto, vocês foram eleitos por quatro anos”, avisou o senador, aos prefeitos durante assembléia geral da Associação dos Municípios de Mato Grosso do Sul (Assomasul). O parlamentar também não vê a mínima possibilidade de os congressistas aprovarem eleição para mandato tampão no país. O que há consenso, segundo o peemedebista, é a aprovação de eleições gerais em 2022. A proposta defendida pelo peemedebista prevê a eleição de prefeitos e vereadores em 2016 para um mandato de seis anos a fim de conciliar a data das eleições únicas. “A partir de então, ou seja, de 2022 em diante, todos os cargos eletivos do Executivo, presidente, governador e prefeito, e Legislativo, vereador, deputado estadual, deputado federal e, inclusive para senador, serão para um mandato de cinco anos, sem reeleição”, explica. Moka entende que a unificação de todas as eleições, além de gerar economia aos cofres públicos, permite ao eleitor escolher todos os candidatos num único dia. “Até porque o voto é obrigatório. E eleição a cada dois anos, da forma como está, é extremamente desgastante”, justifica.

Os “do contra”
Para seus opositores, a proposta apresenta-se como a pior medida possível no texto da reforma. Em entrevista ao jornal “Gazeta do Povo”, o cientista político da UFPR Ricardo Oliveira, disse que o principal problema seria colocar sob uma mesma discussão temas de relevância local e nacional. O risco é que temas importantes como o transporte público, a educação e a saúde no nível municipal e o planejamento urbano se tornem menos influentes na eleição de um prefeito do que as grandes discussões nacionais. Além do mais, Oliveira aponta o risco de uma prorrogação de mandato. Para unir as datas, seria necessário prorrogar os mandatos municipais. "Prorrogar mandato é golpe", resume. Ele acredita que é positivo ter eleições a cada dois anos. "Quanto maior a presença do debate político, melhor."
Assim como Oliveira, o cientista político Adriano Codato, também da UFPR, avaliou como negativa essa mudança. Ele acredita que os motivos alegados, como a redução do número de anos eleitorais, não justificam as perdas decorrentes dessa mudança. "Não há motivo para mudar. A cada quatro anos se discute o Brasil e a cada quatro anos se discutem os problemas municipais."
Em março de 2015, o ex-presidente da Câmara dos Deputados Henrique Eduardo Alves (atual ministro do Turismo), após a realização de um encontro de prefeitos e vereadores em que foi defendida a prorrogação dos mandatos dos atuais prefeitos e vereadores no contexto da reforma política, disse que não há clima para prorrogar os atuais mandatos – de prefeitos e vereadores – e que essa discussão destoa da realidade democrática do país.  “Prorrogar mandato só foi feito na ditadura militar”, afirmou Henrique. Em entrevista ao “Jornal de Hoje”, ele reafirmou: “Sem chance de prorrogar os mandatos, não há clima mais para uma decisão desse tipo”.
Ao opinar sobre a reforma política, Henrique disse que a grande tendência é, justamente, haver coincidência das eleições. “Pelo que ouço e converso dentro e fora do PMDB, há grande tendência para coincidência das eleições. Todas no mesmo ano, embora em dias diferentes, com espaços de dias a discutir”. Mas para se chegar à coincidência das eleições, na avaliação do ex-presidente da Câmara, existem dois problemas a serem resolvidos. O primeiro é ajustar a eleição municipal. Nesse caso, as ideias são mandato de dois anos, ou de seis anos, para haver a coincidência futura. O segundo é o Senado. De acordo com o presidente do PMDB potiguar, como existe uma tendência de se acabar com a reeleição, muitos defendem o mandato de cinco anos, e não mais de quatro.“Mas aí (há) o obstáculo a se resolver do mandato dos senadores. Para coincidir, se passar o mandato do executivo de quatro para cinco anos, o mandato de senador teria que passar de oito para dez anos, e há resistências a se ampliar assim”, analisa o peemedebista.
Já o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, descartou a possibilidade de prorrogação dos mandatos para prefeitos e vereadores com a reforma política. Ele participou de uma audiência pública sobre o tema e o pacto federativo na Assembleia Legislativa, dentro do programa "Câmara Itinerante", em Natal, no dia 10 de abril. “Não adianta. Qualquer prorrogação é inconstitucional. Não vai ter prorrogação de mandato”, destacou Cunha, durante a audiência pública. 
Já o ministro Dias Toffoli, atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral, durante uma audiência pública realizada em março de 2015, que discutia justamente a reforma política, disse ser contrário às eleições casadas e que as eleições periódicas reforçam as praticas democráticas. “O Supremo Tribunal Federal (STF) não vai aceitar a prorrogação dos mandatos dos atuais prefeitos por dois anos, antes que as eleições no Brasil sejam unificadas”, disse ele. Dias Tóffoli sugeriu ainda que, se a medida for adotada pela comissão, ela só passe a vigorar a partir de 2020 ou mesmo depois. Apesar disso, ele afirmou que é contra as eleições casadas. Para o presidente do TSE, eleições periódicas reforçam a importância do sistema político e das praticas democráticas. "O que se precisa são mais eleições, e não menos. Diminuir a frequência das eleições diminui a legitimidade da classe política", afirmou.

Próximos passos
Caso queira que aconteça qualquer alteração nas eleições de 2016, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB), deve levar o tema ao plenário para votação no segundo semestre deste ano. Tal medida é imprescindível, pois para haver qualquer mudança para as eleições do próximo ano, deve-se respeitar o prazo de um ano antes da eleição, e ainda aprovar na Câmara e depois Senado. Trocando em miúdos: todas as modificações terão que ser aprovadas até setembro de 2015.
No caso da coincidência de mandatos, este é um dos pontos mais controvertidos da reforma política, principalmente porque o debate nacional será travado mesma eleição. Ao mesmo tempo, iremos debater desde o problema da do esgoto em determinada rua, ao problema nacional ou regional, como por exemplo, o problema da transposição do rio São Francisco.
Alguns políticos lançam o seguinte alerta: se há necessidade de se coincidir, é por conta do freio que se deve colocar à influência do poder econômico. A presença de eleições de dois em dois anos torna o país voltado para a eleição. E os recursos investidos numa eleição dessa são vultosos. Enfim, a matéria é controvertida e merece exame muito aprofundado. Todos os pontos da reforma política merecem atenção, mas o tema da coincidência dos mandatos merece muito atenção especial – com a prorrogação seria mais fácil, mas a prorrogação fere o sentimento democrático, e o Brasil somente há pouco tempo conseguiu consolidar a sua democracia.

* Fabiana Agra é advogada e jornalista


quarta-feira, 1 de abril de 2015




A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara homenageou, da forma mais perversa, os 51 anos do golpe militar no Brasil, ao aprovar, nesse 31 de março, o voto em separado do deputado Marcos Rogério (PDT-RO), favorável à admissibilidade da PEC 171/93 (que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos). E o placar nem foi apertado: 42 votos a favor e 17 contra. Gol de placa da turma dos reacionários, pelo que vimos.

Antes, foi rejeitado o relatório do deputado Luiz Couto (PT-PB), contrário à proposta de redução da maioridade penal. O paraibano argumentara, acertadamente, que o projeto fere cláusula pétrea da Constituição, o que a tornaria inconstitucional. Já no parecer vencedor, Marcos Rogério afirma que a redução da maioridade penal “tem como objetivo evitar que jovens cometam crimes na certeza da impunidade”. Ele defendeu que a idade para a imputação penal não é imutável. "Não entendo que o preceito a ser mudado seja uma cláusula pétrea, porque esse é um direito que muda na sociedade, dentro de certos limites, e que pode ser estudado pelos deputados", disse.

E pelo que estamos assistindo, confortavelmente da poltrona, trata-se de mais uma briga entre direita, esquerda e os do muro: PT, Psol, PPS, PSB e PCdoB votaram contra a proposta. Os partidos favoráveis à aprovação da admissibilidade foram PSDB, PSD, PR, DEM, PRB, PTC, PV, PTN, PMN, PRP, PSDC, PRTB. Já os que liberaram suas bancadas porque havia deputados contra e a favor foram os seguintes: PMDB, PP, PTB, PSC, SD, Pros, PHS, PDT, e PEN.

Tão logo foi aprovada a admissibilidade da PEC 171/93 – que estava engavetada há mais de 20 anos – começaram a pipocar editoriais em todos os sites de notícia e de opinião. Mas o texto que realmente deu o tom e matou a charada, foi o do “Blog da Cidadania” que explicou as razões pelas quais o PSDB insistiu em desengavetar um projeto de emenda constitucional que estava dormindo em berço esplêndido e sem hora para acordar. Transcrevo o texto na íntegra, pela sua pertinência:
“Para entendermos o que está acontecendo, voltemos a recente pesquisa Datafolha que deu conta de queda ainda maior da popularidade (avaliações bom e ótimo) do governo Dilma Rousseff, agora em 13%. Essa mesma pesquisa mostrou que a imagem do Congresso é ainda pior, com aprovação de 9%. É nesse contexto que se insere a tendência da maioria da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados de colocar para tramitar, de uma hora para outra, um texto que está em debate naquela Casa há 23 anos e que jamais prosperou pela pura e simples razão de que é inconstitucional.
Setores da Câmara, portanto, querem fazer média com a população. Outras pesquisas de opinião mostram que cerca de 90% dos brasileiros acreditam no conto do vigário de que reduzir a idade de responsabilização penal reduziria criminalidade. Desse modo, mesmo com o previsível veto do Supremo Tribunal Federal a uma tentativa de mudança de cláusula pétrea da Constituição, o Congresso passaria à sociedade a ideia de que tentou fazer o que ela queria, o que, supõem esses políticos demagogos, render-lhes-ia dividendos políticos”.

Neste apressado artigo, não irei tratar dos pormenores da inconstitucionalidade da medida, farei isso na próxima ocasião – até porque o assunto irá render muitos panos para as mangas de políticos e da população. Fica aqui apenas o registro de terem acordado uma PEC adulta – eis que dormia candidamente há 23 anos, em pleno 31 de março...

Antes que me perguntem, eu já explico como será a tramitação da PEC 171/93. Vamos lá: ontem, no chamado “exame da admissibilidade”, a CCJ analisou apenas a constitucionalidade, a legalidade e a técnica legislativa da PEC. A partir de agora, a Câmara dos Deputados criará uma comissão especial para examinar o conteúdo da proposta – juntamente com 46 emendas apresentadas nos últimos 22 anos, desde que a proposta original passou a tramitar na Casa – mas querem apostar que esta emenda correrá os 100 metros rasos? Após, a comissão especial terá o prazo de 40 sessões do Plenário para dar seu parecer. Em seguida, a PEC deverá ser votada pelo Plenário da Câmara em dois turnos. Para ser aprovada, precisa de pelo menos 308 votos (3/5 dos deputados) em cada uma das votações.

Depois de aprovada na Câmara, seguirá para o Senado, onde será analisada pela Comissão de Constituição e Justiça e depois pelo Plenário, onde precisa ser votada novamente em dois turnos. Se o Senado aprovar o texto como o recebeu da Câmara, a emenda é promulgada pelas Mesas da Câmara e do Senado. Se o texto for alterado, volta para a Câmara, para ser votado novamente. Neste caso, não cabe veto da Presidência da República, pois se trata de emenda à Constituição. Finalmente, a redução da maioridade penal, se aprovada, pode ser questionada no Supremo Tribunal Federal, responsável último pela análise da constitucionalidade das leis. E não tenho dúvidas de que, caso seja aprovada, essa malfadada emenda acabe sendo jogada fora pelo STF – a não ser que o Supremo também decida por rasgar a Constituição de 1988.

Acredito que os fãs da Raquel estejam exultantes! Mas fica aqui um lembrete para os tais: não há comprovação de que a redução da maioridade penal contribua para a redução da criminalidade. Sim, não há, vamos aos números? Dados coletados pela Carta Capital dão conta de que do total de homicídios cometidos no Brasil nos últimos 20 anos, apenas 3% foram realizados por adolescentes. O número é ainda menor em 2013, quando apenas 0,5% dos homicídios foram causados por menores. Por outro lado, são os jovens (de 15 a 29 anos) as maiores vítimas da violência. Em 2012, entre os 56 mil homicídios em solo brasileiro, 30 mil eram jovens, em sua maioria negros e pobres. Tem mais: nos 54 países que reduziram a maioridade penal não se registrou redução da violência. A Espanha e a Alemanha voltaram atrás na decisão de criminalizar menores de 18 anos. Hoje, 70% dos países estabelecem 18 anos como idade penal mínima. Esses dados serão esmiuçados no próximo artigo.

Por tudo isso, a subprocuradora-geral da República defende que o remédio para a situação não seja a redução da idade penal, mas o endurecimento da pena para adultos que corrompem menores – como o Projeto de Lei 508/2015, do deputado Major Olímpio – e o investimento em políticas sociais para os jovens. Pelo Brasil afora, entidades como a Unicef, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), o Ministério Público Federal (MPF), a Anced (Associação Nacional dos Centros de Defesa dos Direitos da Criança e Adolescente), o Ministério da Justiça e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH) já se manifestaram contrários ao projeto. E qualquer pessoa que trabalha o tema em seu dia-a-dia irá pensar duas vezes e tenderá a ser contra o projeto, por saber que apenas vai piorar o que já está péssimo.

Porém, o PSDB e seus asseclas conseguiram seu objetivo maior: armaram o circo e o palhaço já está fazendo suas estripulias; agora, basta um pouco de pão e a maioria dos brasileiros e brasileiras esquecerão rápido a verdadeira pauta que deveria estar no centro das atenções do Congresso Nacional: a REFORMA POLÍTICA. Essa, pelo jeito, vai agora deitar-se na gaveta onde estava a roncar a PEC 171/93. Que Deus tenha piedade dos pequenos do nosso país – dos pretos e pobres, por óbvio.

* Fabiana Agra é advogada e jornalista