Quem mora no Nordeste sabe – ou deveria saber – que somente há bem pouco
tempo a região passou a ser viável no campo da economia brasileira. Antes,
relegada à “terra de ninguém”, a “campo devastado”, servindo principalmente
como lugar de onde saíam a mão-de-obra barata ou mesmo escrava, que partia para
construir o sudeste ou colher nos campos infindos do centro-oeste, após uma
série de investimentos em obras estruturantes por parte do Governo Federal,
os estados nordestinos começaram a mudar de cenário e, seja ao lado das belas
praias que rodeiam suas costas ou nos seus mais afastados rincões, indústrias
começam a surgir, comércios são estruturados. Sim, ilhas que ainda são, em um
mar revolto; mas que, se possuírem um farol forte, serão porto seguro para
investidores e aí sim, em breve o Nordeste também dará as cartas no cenário
político e econômico brasileiro.
Por enquanto, de carta mesmo, tivemos a “Carta de Teresina”, documento
assinado pelos nove governadores nordestinos, documento final do 4º Encontro de
Governadores do Nordeste, encerrado no último dia 17 de julho, na capital do
Piauí. O cofinanciamento das políticas de segurança pública, a compensação previdenciária
entre União e estados e a definição de uma meta de investimentos em ciência e
tecnologia são pontos de debate que os governadores devem levar ao governo
federal para negociação. No documento, os gestores sugerem a criação de um
sistema nacional de segurança pública e justiça que envolva o repasse de verbas
federais para os estados nos moldes do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Fundo
de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação (Fundeb).
Entre os eixos de ação propostos pelos governadores, está a liberação de
recursos do Fundo Penitenciário Nacional, atualmente contingenciados, para a
construção de um presídio com capacidade média de 250 pessoas em cada estado da
região. Aliado a isso, os gestores propõem incentivo à “criação e implementação
de mecanismos e alternativas à prisão, associados a uma política de
ressocialização”.
Quanto à Previdência, os governadores propuseram formas de capitalizar
os regimes próprios de Previdência Social dos estados, dos quais fazem parte
servidores públicos efetivos. Eles também demandam do governo federal uma
compensação financeira para que os estados consigam dar conta do piso do
magistério no pagamento dos aposentados e pensionistas.
No campo da ciência, tecnologia e inovação, a Carta de Teresina
reivindica a aplicação de 28% dos recursos investidos anualmente pela União em
ações no Nordeste, no prazo de quatro anos. Entre as ações destacadas estão o
desenvolvimento de tecnologias de gestão da água, a ampliação da infraestrutura
e utilização da internet e o incentivo à agricultura familiar.
Junto com a Carta de Teresina, os nove governadores do Nordeste lançaram
também um manifesto de apoio à presidenta Dilma Rousseff. No documento, eles
afirmam acreditar que o país retomará o crescimento econômico e social e
consideram “incabível” a interrupção do mandato presidencial. Eles destacam
ainda que o mandato de quatro anos determina um prazo para que os compromissos
de campanha sejam cumpridos, os desafios, vencidos e os ajustes sejam feitos,
os projetos, implementados e os resultados, colhidos.
Após o encontro, Camilo Santana, atual governador do Ceará, concedeu uma
entrevista à Carta Capital, onde clama por uma agenda positiva, lembrando que
“a radicalização não traz benefícios”. Santana defende o fortalecimento das investigações de corrupção na linha
“doa a quem doer” e o direito de manifestação das oposições, mas critica as
tentativas de desrespeito à democracia e à vontade da maioria expressa nas
eleições do ano passado. À presidenta Dilma Rousseff recomenda disposição para
o diálogo. Ao PT, o governador recomenda a reinvenção.
É isso. É o Nordeste sinalizando para o
resto do Brasil. É o povo nordestino mais uma vez dando o mote para a resolução
desse novo e estranho tempo, onde o conservadorismo e rompantes reacionários
parecem tomar de assalto o Congresso Nacional. O último protagonista neste
cenário nonsense foi o deputado federal
Laerte Bessa (PR-DF), relator da PEC 171/93 que reduz a maioridade penal de 18
anos para 16 anos. Em entrevista para o jornal inglês The Guardian, Laerte Bessa disse, em relação ao tema: “Daqui a uns
vinte anos vamos reduzir para 14 anos. Depois de mais 20 (anos) vai para 12 e
vai baixando até chegar na barriga da mulher”, falou na entrevista gravada,
divulgada esta semana pelo jornalista Bruce Douglas. “Quando chegar na barriga
da mulher”, acrescentou Bessa, “os cientistas já inventaram uma forma de
descobrir antes do moleque nascer se já é criminoso e não vão deixar nascer. Aí
vai resolver o problema”.
O parlamentar chegou a divulgar nota por meio da página oficial dele no Facebook alegando que foi mal-interpretado pelo The Guardian. Mas na mesma postagem, o repórter Bruce Douglas direciona o leitor para um áudio da conversa que teve com o deputado – sem chances de ter acontecido uma má interpretação de sua fala, o que vemos é uma má ocupação das cadeiras do Congresso Nacional, onde estão sentadas pessoas da espécie de um Eduardo Cunha ou de um Laerte Bessa – este pelo jeito pensa que a vida não vale nada.
O parlamentar chegou a divulgar nota por meio da página oficial dele no Facebook alegando que foi mal-interpretado pelo The Guardian. Mas na mesma postagem, o repórter Bruce Douglas direciona o leitor para um áudio da conversa que teve com o deputado – sem chances de ter acontecido uma má interpretação de sua fala, o que vemos é uma má ocupação das cadeiras do Congresso Nacional, onde estão sentadas pessoas da espécie de um Eduardo Cunha ou de um Laerte Bessa – este pelo jeito pensa que a vida não vale nada.
Mas o Nordeste reage a essa maré que está
derramando uma baita ressaca em todo o Brasil e escreve a sua carta. O
governador cearense reforça o sentimento que reina por aqui, mandando o seu
recado: “A crise política me
preocupa mais do que a crise econômica. Vejo um quadro complexo. A oposição tem
o legítimo direito de se posicionar, de manifestar-se, mas o Brasil não pode
ficar preso a uma agenda negativa. A radicalização não trará nenhum benefício
ao País. É o momento de desarmar os espíritos, pensar no futuro, apoiar uma
visão mais patriótica e respeitar a democracia, conquistada a duras penas”.
O povo nordestino não quer “voltar atrás”;
o povo nordestino quer ser protagonista de sua própria história e continuar
nesse passo desenvolvimentista que teve início em suas terras. Sim, é preciso
combater a corrupção, cortando a própria carne – e punir os culpados quando
seus crimes forem comprovados. O que o Nordeste não permite – e isto deve valer
para as demais regiões brasileiras –, é que o avanço social e estrutural
ocorrido nos últimos anos seja parado por maquinações de uma oposição sem
agenda. É o Nordeste mandando o seu recado, “quem tem ouvidos, ouça”.
* Fabiana Agra é advogada e jornalista
Com
Agência Brasil e Carta Capital
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